terça-feira, 15 de abril de 2014

Dicas de gravação e mixagem

Dicas de gravação e mixagem

Germano Lins

Pré Produção


A preparação, planejamento, ou pré-produção é fundamental em qualquer projeto de gravação com intenção profissional. Antes de começar a gravar é de suma importância definir muito bem os timbres que serão gravados. Devemos escolher corretamente os instrumentos, regular (afinar) de acordo cordas, peles, amplificadores, pedais, etc. Tudo deve ser testado e definido, e só depois de cumprida essa etapa, damos início às gravações.

Outra coisa muito importante é reservar um tempo para experimentar ou testar as captações, com microfones, prés, conversores, cabos, posicionamentos, etc. Devemos experimentar até definir o setup ideal dentro dos recursos que estão disponíveis. Nunca devemos usar a desculpa de que os equipamentos utilizados não são bons o bastante. Ao invés disso, devemos nos certificar de estar tirando o melhor que os recursos disponíveis oferecem e deve ser gasto o tempo que for necessário para garantir que uma boa captação seja feita.

Outra coisa a ser lembrada é a importância de gravar bem, pois com o avanço da tecnologia muitos acreditam que processamentos fazem milagres e acabam relaxando na hora de captar, pensando que depois tudo poderá ser corrigido na mixagem ou na masterização. A possibilidade de correção e manipulação é realmente grande, mas deixar que a qualidade da gravação dependa de correções e processamentos, definitivamente não é o caminho correto a ser seguido. O segredo de uma boa gravação está muito mais na captação do que no processamento. O processamento virá depois apenas para realçar um bom timbre captado ou para corrigir pequenas diferenças que não foram possíveis acertar na captação.

Jim Scott ao mixar um famoso álbum do Red Hot Chilli Peppers disse certa vez, "Nosso ponto de partida foi a gravação que já soava tão bem! Na verdade soou muito bem desde o primeiro dia, então não havia necessidade de alteração. Queria ter tido um pouco mais de trabalho na mixagem. Tudo que precisei fazer foi ajustar os volumes!"

Claro que se trata de uma gravação feita nas melhores condições e com todos os recursos possíveis, além de músicos experientes. É quase certo que em uma produção mais simples a mixagem será muito mais do que apenas ajustar volumes, mas o segredo definitivamente está em gravar bem, está na captação. A gravação sempre será a matéria prima do trabalho de áudio e quanto menos precisarmos alterá-la melhor será o resultado final.

Tenha a certeza de que os álbuns dos artistas de nome soam muito bem porque antes de mais nada foram muito bem captados. Nos grandes projetos de áudio profissional vemos sempre grande empenho durante o planejamento e captação para que as etapas seguintes possam fluir tranquilamente.

Resolução de Bits (Bit Depth)

A captação deve ser feita em 24 bits, e a mixagem deve ser feita nessa mesma resolução. Para quem possui sistemas que suportam 32bit (float), a edição e mixagem podem ser feitas nesta resolução, que trabalha com alta margem dinâmica e garante grande precisão nas edições e processamentos. Nunca devemos reduzir a resolução de bits dos arquivos ou utilizar dither. Todo o trabalho de gravação, edição, mixagem e masterização devem ser feitos em resoluções de bits altas, e só reduzido pelo técnico de masterização na última etapa do trabalho.

Taxa de Amostragem (Sample Rate)

Se possível, devemos gravar em 96 kHz, pois além dos conversores trabalharem com mais precisão nesta taxa, o processamento digital também soa melhor. Toda a distorção e degradação que o processamento digital pode gerar são distribuídas em regiões inaudíveis, deixando o processamento digital com uma sonoridade mais analógica. Agora, é de suma importância que nenhum tipo de conversão de sample rate seja feita durante todo o processo de gravação, edição, mixagem e masterização. A taxa de amostragem só será reduzida pelo técnico de masterização quando todo o trabalho estiver concluído.

Trabalhar com Margem

Devemos ajustar os níveis de entrada para a gravação com picos máximos em -6 dBFS. Esta margem é muito importante importante para evitar que o sinal atinja o limite máximo (0 dBFS) que poderá gerar perdas e distorções irreversíveis. Devemos fazer com que os músicos toquem no nível máximo que pretendem atingir com seus instrumentos e a partir desta intensidade ajustamos o sinal de entrada em -6 dB. Desta forma garantimos que mesmo nos momentos mais fortes da música a gravação não irão clipar (distorcer).

Panorama

Uma boa distribuição dos elementos no campo estéreo faz uma grande diferença na mixagem. O Pan ajuda a encontrar espaços na distribuição dos elementos da melhor maneira. Timbres com predominância na mesma região acabam brigando por espaço na mixagem e o posicionamento do Pan pode ajudar a resolver o problema. Principalmente se a gravação for muito cheia (muitos instrumentos/elementos), devemos trabalhar o Pan para encontrar o espaço ideal de cada elemento. Um bom panorama estéreo enriquece a mixagem.

Equalização

Quando se capta adequadamente a necessidade de equalização diminui. Se tivermos que corrigir com o equalizador é sinal de que algo está errado com o timbre captado e talvez seja melhor captar novamente. Na etapa de gravação devemos avaliar as reais necessidades de equalizar e devemos apenas efetuar alterações leves e naturais. Técnicos pouco experientes costumam pensar que tudo deve ser equalizado e "timbrado". Devemos sempre nos lembrar que o excesso de equalização soa desagradável e artificial. Então só devemos fazer uso desta ferramenta quando houver real necessidade de alteração de timbre ou por uma questão artística.

Devemos utilizar equalizadores paramétricos de quatro ou cinco bandas que são mais que suficientes para as necessidades de timbragem. Utilizamos  curvas abertas e naturais atenuando ou elevando toda uma região de frequências e devemos evitar regiões estreitas ou frequências isoladas.

As regiões de frequências são divididas da seguinte forma:

Sub-graves de 0 à 25 Hz (Esta não é uma região musical e pode ser cortada)
Graves de 25 à 120 Hz
Médios-graves de 120 à 350 Hz
Médios de 350 à 2000 Hz
Médios-agudos de 2000 à 8000 Hz
Agudos de 8000 à 12000 Hz
Banda de Ar de 12000 à 22000 Hz

Na hora de equalizar devemos considerar sempre estas regiões e utilizar curvas abertas, ajustando a frequência no centro de cada região que necessitar correção. Devemos experimentar com todos os timbres, aumentando e reduzindo cada região para identificar onde se encontram seus harmônicos principais. Desta forma aprenderemos a reconhecer as regiões predominantes de cada timbre, podendo reconhecê-las em casos de ajustes. Devemos também avaliar sempre as reais necessidades de equalização e buscar resultados alinhados para cada elemento da mixagem. O foco deve ser mantido na tentativa de reproduzir o timbre como ele realmente é. Lembre-se da forma que os ouvidos captam cada timbre diretamente de sua fonte sonora e busque um resultado fiel em suas gravações.

Compressão

Compressores são ferramentas que visam o controle da variação entre os níveis de intensidade dos sons, que podem variar muito, principalmente em instrumentos acústicos e vozes. Com exceção de estilos mais puristas como o Jazz e Música Clássica, as mixagens modernas trabalham com muita compressão. Em toda a história da música nunca foram ouvidas gravações tão comprimidas como nos dias de hoje. Praticamente tudo que se houve em rádio e TV têm forte compressão.

O uso correto dos compressores pode fazer toda a diferença em sua mxagem, realçando timbres e aumentando sua presença. Técnicos menos experientes tentam equalizar os timbres em busca de mais destaque para eles, quando na verdade muitos casos necessitam apenas de uma boa compressão. Se a variação de intensidade de determinado timbre é muito grande, é provável que ele fique um tanto perdido em meio aos outros elementos, variando em momentos de maior ou menor destaque. Mixagens profissionais têm todos os elementos em destaque, com clareza e presença, e isso se deve muito a compressão. É muito importante o conhecimento e domínio deste tipo de ferramenta. Compressão não é um assunto fácil e pode comprometer sua gravação se não aplicada corretamente. É recomendável praticar e estudar muito o assunto, pois uma das maiores diferenças na sonoridade dos produtores mais experientes está justamente na compressão.

Ambiência

Quando ouvimos um instrumento, chega aos nossos ouvidos o timbre do instrumento somado à reverberação do ambiente. O som do ambiente é um componente importante da música, mas nem sempre é possível captarmos com ambiência adequada. Muitos estúdios, principalmente os domésticos têm sonoridade excessivamente seca, e neste caso pode ser importante o uso de um bom reverb para emular um ambiente mais favorável à música.

Referências

Utilizar uma gravação profissional como referência e comparação na hora de fazer uma mixagem é algo muito útil, principalmente para quem não tem bons monitores de áudio e uma sala com tratamento acústico adequado. Cada estilo musical trabalha dentro de determinados padrões de mixagem e o uso de uma gravação profissional como comparação é importante para quem ainda está aprendendo a trabalhar dentro destes padrões, e para quem não possui uma resposta sonora realmente confiável em seu estúdio.

A gravação usada como referência provavelmente estará masterizada e com um nível de intensidade sonora maior que sua mixagem. Para não se enganar com esta diferença, importe a referência para dentro da sessão de sua mixagem e deixe o canal em mute. Colocando-o em solo e voltando para mute você fará uma comparação rápida entre a referência e sua mixagem. Reduza o volume da referência até que se iguale à sua para que você possa fazer uma comparação mais justa. Não utilize nenhum plug-in ou processamento no canal de saída (stereo out) da mixagem para não alterar a sonoridade da referência.

Conclusão

É importante que um bom tempo seja gasto na hora de escolher os timbres e captar, na tentativa de garantir a melhor gravação possível. Tendo bons timbres registrados, a etapa de processamento e aplicação de efeitos deve ser feita com cuidado e critério, somente quando houver real necessidade ou intenção. E talvez a dica mais interessante para os produtores iniciantes seja o uso de gravações profissional como comparação. Obviamente que ao usarmos uma referência não estamos tentando imitar a sonoridade e nem queremos que a nossa mixagem perca a originalidade, mas a referência é importante para nos situarmos dentro do padrão de mercado e evitarmos erros devido a alguma deficiência do sistema de som, falta de experiência ou até mesmo o cansaço de nossos ouvidos.

Em outras épocas só era possível gravar um álbum musical gastando muito dinheiro em grandes estúdios, e este era um sonho que poucos podiam realizar. Porém nos dias de hoje qualquer um com um computador, uma placa de som e um microfone consegue se aventurar no mundo do áudio e da produção musical. Por um lado, as facilidades da tecnologia tornam este sonho possível para muita gente, e por outro, a qualidade das gravações caiu muito por não estar somente nas mãos dos profissionais como era feito antigamente.

O trabalho com áudio é bastante complexo e exige muita dedicação, prática e estudo. Geralmente os bons técnicos possuem no mínimo dez anos de experiência no assunto. É preciso acumular muita experiência e conhecimento. Procure livros, vídeos, cursos, estágios em grandes estúdios e pratique muito. A tecnologia de áudio não pára de avançar e as facilidades estão ai, mas a qualidade dos trabalhos SEMPRE dependerá do fator humano. Preocupe-se mais com seus conhecimentos do que com equipamentos. Qualquer um com dinheiro pode comprar um avião, mas pilotá-lo são outros quinhentos.


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